sábado, 30 de abril de 2011

Mensagem para a ABAP sobre o Novo Código Florestal Brasileiro.

ABAP - Associação Brasileira de Arquitetos Paisagistas

Olá, amigos. Compartilho aqui com vocês mensagem de e-mail que enviei para a ABAP sobre o novo Código Florestal Brasileiro. Ando muito angustiado com o encaminhamento que está sendo dado às alterações no nosso código florestal e estava carente de um posicionamento mais aberto e conjunto dos arquitetos, especialmente dos paisagistas. Segue abaixo a minha mensagem :


Olá, equipe da ABAP.
Como vão vocês?

          Sou estudante de arquitetura da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e tenho acompanhado com cautela as discussões no Congresso Nacional sobre as alterações no Código Florestal Brasileiro. Não me restam dúvidas de que atualizações são necessárias e de que um novo código precisa ser discutido, afinal nosso último código florestal foi elaborado há mais de 45 anos atrás. Porém, como temos podido acompanhar pela mídia, ruralistas e ambientalistas estão travando um desigual embate na defesa dos pontos a serem modificados para o novo código.

         Nesse sentido, como estudante de arquitetura conheço bem a importante contribuição do paisagismo como campo de conhecimento e ação no que diz respeito à paisagem brasileira. Sendo assim, e tendo em vista as grandes alterações na paisagem que um novo código florestal pode representar, sinto falta de conhecer um posicionamento aberto e conjunto dos paisagistas brasileiros a respeito do novo código. Acompanho os informes do boletim de notícias Paisagem Escrita, da ABAP, e somente encontrei referências ao Novo Código Florestal em relação ao posicionamento da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e da Academia Brasileira de Ciência.

         Sabendo que nessas próximas semanas passaremos por momentos decisivos no que diz respeito às modificações do Código Florestal Brasileiro, gostaria de conhecer melhor o posicionamento da ABAP em relação ao novo código. Conheço bem e apoio a atuação da instituição, que em muito contribuirá para fortalecer e fomentar o nosso novo Conselho de Arquitetura e Urbanismo, principalmente no que diz respeito às cartas abertas dirigida à sociedade. A Carta da Paisagem Brasileira, de 2010, sem dúvida condensa as conquistas e contribuições que o paisagismo brasileiro alcançou nesses últimos tempos, revelando, de alguma maneira, um posicionamento em relação ao Novo Código Florestal do nosso país. Mesmo assim, como estudante de arquitetura me faz falta um posicionamento mais ativo de demonstração da nossa opinião conjunta como estudiosos da paisagem em direção aos congressistas do parlamento brasileiro.

          Onde posso encontrar este tipo de manifestação? Poderiam me sugerir links ou caminhos para que eu possa conhecer melhor o posicionamento e a atuação de nossas instituições de arquitetura, urbanismo e paisagismo no que diz respeito ao novo código florestal? Será que já existem manifestações públicas e abertas que eu ainda não tomei conhecimento? Se não, não será este um momento oportuno de manifestação aberta de uma nova carta da ABAP em relação ao seu posicionamento sobre o novo Código Florestal Brasileiro?
 
         Muitas dúvidas típicas de um estudante de arquitetura, que eu espero que vocês possam me ajudar a decifrar. Ficarei realmente muito feliz com isso! Agradeço muito a boa vontade de vocês em receberem minhas dúvidas e questões e obrigado pela paciência na leitura desta mensagem.


Um grande abraço e um ótimo final de semana.
Conrado Vivacqua

quarta-feira, 27 de abril de 2011

ENTREVISTA com o Prof. Wilson Jorge

WILSON JORGE é professor do departamento de projeto da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP. Sua Livre-Docência teve como título O SISTEMA PENITENCIÁRIO DO ESTADO DE SÃO PAULO E OS PROJETOS DE ESTABELECIMENTOS PRISIONAIS.

ARQUITETURA E LIBERDADE

1PRECONCEITO COM ARQUITETURA PRISIONAL

transbordarquitetura!: Sabemos que a população carcerária brasileira beira, hoje, os 500.000 presos e que enfrentamos um calamitoso déficit de vagas no sistema prisional do nosso país. Mesmo assim, quando pensamos no envolvimento da arquitetura com questões públicas e de grande urgência política, ainda é raro, tanto no campo acadêmico quanto no mercado privado, encontrarmos exemplos de incursões na questão do problema prisional. Como você avalia o encontro entre a arquitetura e as questões carcerárias do nosso país? Ainda há um forte preconceito da arquitetura brasileira em abraçar essas questões?

Prof. Wilson Jorge: Os projetos carcerários são polarizados por dois conceitos que estão na base de toda concepção para os edifícios prisionais: o isolamento versus a ressocialização. A experiência de projetos acumulada no tema ainda sofre uma influência muito forte da visão conservadora, tanto do setor prisional, como da própria sociedade, de que o detento precisa ser basicamente isolado da sociedade, não merecendo maiores preocupações, nem maiores cuidados no cumprimento de sua pena. O tema se resumiria, nessa posição, em construir mais vagas, com o mínimo de investimentos, para reduzir o “déficit”, esvaziar as delegacias e diminuir a superlotação dos presídios. Poucos projetos refletem um maior cuidado com a questão da ressocialização que se consubstancia nos cuidados com os espaços em que o detento convive, se prepara para a futura liberdade e se comunica com o espaço externo, através das visitas, atendimentos,etc. Já tive oportunidade de encontrar esse preconceito em situações até imprevistas, por exemplo, arquiteto que projetou uma unidade socioeducativa de internação e que afirmou não ser um projeto que iria deixá-lo orgulhoso! Saliento também que uma questão anterior ao projeto e muito séria é a sua localização que já pode trazer problemas definitivos para a ressocialização.

2CONCURSO DE IDEIAS NESSA ÁREA

transbordarquitetura!: Alguns países europeus, como a Dinamarca, promovem concursos abertos de projetos de arquitetura para a construção de seus presídios. Você acha que é possível se pensar a realização de concursos de arquitetura para complexos penitenciários brasileiros? Seria esta uma boa forma de aproximar e sensibilizar os arquitetos para o problema carcerário do Brasil?

Prof. Wilson Jorge: Estamos ainda longe de se chegar a uma situação onde será possível abrir concursos para os complexos penitenciários. É necessário que o Estado afirme sua disposição de adotar projetos mais adequados e inseridos em uma política efetiva de ressocialização dos detentos. Além do que, é necessário que deixe de lado a política de sigilo para os projetos prisionais, na alegação de problemas de segurança. A questão carcerária está tão longe do interesse dos arquitetos que não conheço nenhuma comissão dos IABs tratando do assunto. Se existe, gostaria de entrar em contato.

3GERAÇÃO DA FORMA COMO LIBERDADE

transbordarquitetura!: A arquitetura moderna brasileira é muito conhecida por ter revelado na forma seus discursos políticos por liberdade. Grandes vãos, pilotis e a ausência de fechamentos são elementos que evocam o ideal de liberdade presente em diversos projetos de arquitetura, especialmente por aquela feita em nosso país. Sendo assim, como você imagina que nossa herança moderna pode se converter em um recurso potente para pensarmos projetos referentes a edificações carcerárias a serem construídas para o nosso país?

Prof. Wilson Jorge: Sim. Não tenho dúvida que essa herança, traduzida na capacidade dos arquitetos em conceberem soluções globais (inclusive a questão da pré-fabricação ou pré-moldagem), de enfrentar as premissas que a sociedade e o Estado colocam para o tema, levaria a resultados melhores para aquelas edificações e, como conseqüência, uma evolução para o setor.

__

Gostaria de agradecer a participação do arquiteto e professor Wilson Jorge nessa entrevista, que contribuiu e muito para nossa discussão sobre o tema da Arquitetura e a Liberdade. Não sobram dúvidas de que os problemas que envolvem os complexos penitenciários precisam com urgência ser abraçados por toda a sociedade, sendo da arquitetura um papel de destaque na formulação de novos paradigmas e na busca por justas e criativas soluções para as edificações carcerárias. Obrigado professor pelas sua contribuição!


sexta-feira, 15 de abril de 2011

Sobre a profundidade imperceptível

Hoje me deparei com uma daquelas proposições que sabemos que nunca chegarão ao fim, mas que exatamente por isso nos dão a certeza de que para sempre nos acompanharão. Talvez ela também faça sentido para vocês e pode até ser que também os alimente por um bom tempo, ou quem sabe para sempre. Assim espero.

Para a Arquitetura, parece que temos aqui um bom tema de discussão, tema este que por ser inesgotável precisa se manter ecoando nos discursos daqueles que projetam e pensam a Arquitetura. Para mim, sem dúvida, surge um tema a perseguir com a certeza das frustrações e impossibilidades inerentes a esta busca. Mas será que existe caminho mais profícuo?

Trato aqui da profundidade imperceptível, aquela que muito poucas vezes lidamos ou aprendemos nas escolas de arquitetura, mas que é indissociável à própria idéia de arquitetura ou ação do arquiteto. Porém, parece que por não encontramos instrumentos fáceis, codificáveis ou mensuráveis para torná-la evidente, simplesmente a ignoramos. Tornamos a dificuldade óbvia em uma estranha barreira intransponível.

Nesse sentido, transcrevo aqui o fragmento do texto Corpo-gênese ou tempo-catástrofe: em torno de Tanaka Min, de Hijikata e de Artaud, do filósofo japonês Kuniichi Uno, retirado dos Cadernos da Subjetividade, de 2010. Foi nele que despertei para a necessidade evidente do eterno encontro da arquitetura com o tema da profundidade imperceptível, algo que parecia estar dormente em algum canto escondido de mim. Também não estará ele escondido em um cantinho de vocês? Assim diz Uno:

“É verdade que somos todos jogados no mundo como um corpo só e isolado. Esse corpo é isolado no mundo e ao mesmo tempo ligado ao mundo, invadido por este mundo. Esse corpo está entre outras coisas e outros corpos, na distância entre eles, medindo essa distância sem cessar. Mas a distância não cessa de variar no espaço que constitui o mundo com sua profundidade imperceptível. A forma, a grandeza, a qualidade, tudo o que é mensurável sai somente dessa profundidade. Certamente cada um pode descer a essa profundidade. Não há regra nem escala para medi-la. Os pintores que descem a essa profundidade são freqüentemente obrigados a reinventar a perspectiva ou a geometria. Penso em Turner, Michaux, De Kooning, que sempre interessaram Hijikata.”

É assim que exponho a todos nós, principalmente àqueles que pensam arquitetura, a questão de uma profundidade que se revela subliminar aos instrumentos que usualmente conhecemos e adotamos. Não se trata aqui de um discurso em defesa ao abandono das ciências exatas e dos nossos bons e velhos instrumentos de projeto, pelo contrário, sinto apenas a necessidade de ressaltar a existência de necessidades anteriores e formadoras daqueles instrumentos que utilizamos.

Não conseguiria nunca esgotar este tema, e jamais seria minha intenção aqui. Então espero, de verdade, ter trazido para nós uma eterna voz questionadora que nos force a procurar uma dimensão esquecida da nossa experiência no espaço, principalmente para aqueles que, assim como eu, encontraram na arquitetura uma forma de expressão dentro deste espaço.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Brasília sem concreto


                                          A Brasília do Concreto

Estará a história de Brasília irreversivelmente ligada ao uso do concreto armado? Disso não temos dúvidas. Afinal, o projeto moderno de Lucio Costa para a capital federal do Brasil, patrimônio mundial pela UNESCO, está diretamente relacionado à apropriação da arquitetura brasileira daquele que havia se tornado o material mais revolucionário de sua época: o concreto. Porém, se Brasília para sempre será o emblema de uma arquitetura que consolidou o uso do concreto em sua forma de construir e idealizar a cidade, não haverá no futuro de sua arquitetura oportunidades para a experimentação de outros materiais? Que caminhos podem se abrir na direção de encontrar em Brasília novas possibilidades para se pensar a forma, a criatividade e a sustentabilidade da arquitetura no Brasil?

Algumas respostas para estas questões podem estar na própria Brasília do concreto, escondidas nos vestígios deixados pela sua suntuosa construção. Pois, para que a cidade moderna surgisse no meio do planalto central brasileiro, região selvagem do interior do país, foi preciso deixar muitas pegadas e resíduos para trás. Brasília teve um custo, material e social para o Brasil, custo este que pode se converter em potência para refletirmos sobre novas formas de pensarmos o futuro das cidades brasileiras, especialmente o da capital federal do país.


                                                            Sacolândia

Nesse sentido, enquanto o traço genial do arquiteto, de geometria e cores puras, fazia surgir uma cidade do zero, outra, igualmente nova, genial e inusitada era construída pelos arquitetos anônimos com os restos deixados pela sua irmã mais abastada. Trata-se de Sacolândia*, uma dentre tantas outras aglomerações de moradias dos trabalhadores de Brasília, porém a única a ter sua pobreza singularmente exposta pelos seus casebres cobertos pelos sacos vazios do cimento usado na grande obra da nova capital federal.
Mas se a pobreza se expunha e era tamanha naquelas frágeis habitações, uma generosa e rica criatividade se ocultava em cada um de seus detalhes. Criatividade essa tão brasileira em suas formas e arquitetura quanto àquela reservada às super-quadras modernas, aos ministérios e aos palácios da capital federal. Então por que Sacolândia não está tão presente no imaginário da arquitetura quanto está Brasília? O quanto deixamos de aprender com uma arquitetura brasileira que está submersa e que ainda precisamos nos apropriar?


                                                   Earthbag Building

Talvez se nos permitirmos nos deter um pouco mais nessas dúvidas possamos nos encaminhar para novas descobertas surpreendentes na forma de projetar e pensar arquitetura no Brasil. Talvez possamos encontrar formas tão incríveis como as da emblemática Brasília do concreto, mas que façam parte de novas discussões e novas maneiras de nos defrontarmos com os dilemas do nosso tempo. Por exemplo, o que dizer do earthbag building como técnica construtiva? Quais experimentações encontramos com essa técnica aqui no Brasil? Sacolândia seria outra se, ao invés de abrirem os sacos e forrar suas casas, aquelas pessoas tivessem resolvido encher os sacos de cimento com terra ou areia para formar paredes mais fortes? Não serão estas respostas que precisam ser buscadas pela arquitetura contemporânea brasileira?

Afinal de contas, Brasília e o todo o legado da arquitetura moderna brasileira não nos ensinam apenas a partir de seus acertos e glórias, mas também de seus erros e de suas questões não resolvidas. Reconhecer isso não é desmerecer aqueles incríveis arquitetos que tanto admiramos, pelo contrário, esta é a forma mais genuína de abraçarmos seus ideais e projetos. A arquitetura contemporânea brasileira precisa ser uma resposta aquela genial arquitetura do passado e não uma mera repetição ou continuidade. Existe uma Brasília sem concreto que nos revela haver no avesso da arquitetura moderna a existência de uma arquitetura outra, ulterior e ao mesmo tempo tão afetivamente ligada a ela. Arquitetura contemporânea e brasileira.

*conheci Sacolândia há pouco tempo, através da exposição AS CONSTRUÇÕES DE BRASILIA que estava em cartaz no IMS do Rio e depois foi para o SESI em Sampa.  Foram reveladas pelas magistrais lentes de Marcel Gautherot.